Os programas de culinária se proliferam pelos canais de televisão mais rápido do que o vírus da gripe. Mesmo nos canais fechados a programação está tomada por apresentadores cozinheiros ou por atores/atrizes, ex-modelos, alguns fracassados na profissão, outros apenas o auge passou e os contratos com as emissoras exigem um tempo mais de trabalho.
Fugir às tentações gastronômicas vira um verdadeiro pesadelo para aqueles que querem perder uns quilinhos a mais. Manter a beleza se tornou uma batalha quase midiática contra Anas Carolinas, Rodrigos Hilberts, Belas Gils, Olivers, Oliviers, ex-maridos da Eliana, etc. E saber que antes sofríamos apenas com Ana Maria e dona Palmirinha; com muita falta de sorte, já que quase ninguém vê aquele canal sem graça da Gazeta, e as coroas só lembram dele por causa do eterno príncipe Roni Von, nos defrontávamos com mama Bruschetta, mas aí tem seu tom de graça.
Mas como desgraça pouca é bobagem, diz a voz do povo, as mulheres começam a sonhar com um marido moderno, que cozinhe, que seja como Rodrigo Hilbert, o apresentador de "Tempero Família". As discussões em família ganham um novo item para a terapia de casal, para as rodas de autoajuda dos encontros de Casados para Sempre e outros genéricos, que só têm o mérito de mostrar como os casais foram burros e havia homens e mulheres melhores à volta para a escolha dos cônjuges em crise.
O pior é quando se para, olha para a mulher ao seu lado, no sofá da sala, quase comendo a colher diante da tevê e não sabemos se é o sorvete que está delicioso ou se é um ato falho e ela imagina-se despindo o Hilbert que salta aos olhos dela pela tela do aparelho. A segunda fase é pior, passa para a verbalização das agressões contidas: "Está vendo, ele é rico, famoso e sabe cozinhar! Você não presta nem para fazer uma omelete, quando muito acerta o ponto do miojo".
Não bastasse essa humilhação, um amigo do grupo do WhatsApp, último reduto da masculinidade moderna, em uma versão repaginada do clube do Bolinha, entra todo animado falando que viu o Hilbert matando um carneiro. O ânimo era tanto de nosso amigo que seguramos sua heterossexualidade com muito esforço. Até no Whats é demais. Isso já é perseguição.
Assim, a hora da janta virou uma tortura. Cada prato que é colocado na mesa, vemos o suspiro das amadas aguardando mais um programa do bonitão, enquanto serve o bundão do marido e a prole, que se for feminina, vai se juntar à mãe para exaltar as qualidades másculas do apresentador que sabe cozinhar. O inferno é completo quando o amigo do WhatsApp posta no grupo que o cara vai cozinhar em novo episódio. Nada de repetições de meio de semana.
Procurei o psicólogo quando o caldo engrossou e quase entornou. Ao dormir, tive pesadelos com o Rodrigo Hilbert correndo atrás de mim, só de ceroulas e com uma machadinha na mão para me degolar como se eu fosse o cabrito da vez. Até tentei o padre, mas ele também assistia ao programa do catarinense metido a cozinheiro. Há alguns anos já fizera terapia, sonhava que mama Bruschetta fazia Pole Dance para mim e me perseguia em torno da mesa. Mal sabia que o horror aumentaria.
A saída era me conformar. Os canais de tevê estão cheios de programas de comida. Mas, como último bastião da resistência de minha masculinidade, liguei o aparelho no canal da Globo, vi Ana Maria fazer hummmmmm, depois procurei Palmirinha com aquele boneco chato e seus visitantes e, por fim, voltei para o canal da bestialidade nacional e assisti ao "Encontro". Lampejo dos últimos que tive e ainda na esperança de recuperar o que sobrara de minha dignidade pós Rodrigo Hilbert, disse:
"Mor, a Fátima se separou do Willian Bonner!!"