domingo, 4 de agosto de 2019

Despedida

Ambos estavam ansiosos.

O ônibus como sempre estava atrasado no terminal de Curitiba.  Havia várias pessoas impacientes na plataforma de embarque e, indiferentes ao casal, nem imaginavam, que os dois desfrutavam cada minuto de atraso. Se fosse em outra situação, talvez, tivessem pressa, mas agora não, era diferente.

O moço acercou-se à namorada e a envolveu em um abraço de serpente, ela sentiu sufocar um pouco, mas precisava daquela força para resistir à ideia da partida e aos fantasmas que viriam juntos com a distância. Sentiu que o coração dele acelerava. Era a certeza do amor.

Mal sabiam eles que a distância seria o término em suspenso naquele dia fatigante na rodoviária. O amor não resistiria ao adeus ou ao meio adeus, misturados às promessas de volto logo, eu vou te ver e outras formas de iludir a dor e a tristeza.

Se fumasse, o moço estaria trocando um cigarro pelo outro. Mas, não fuma, aspira lentamente o odor que exala do cabelo da namorada; não quer perder o cheiro que o agradava tanto quando era deixado por ela no travesseiro logo pela manhã. Várias vezes trocou seu travesseiro pelo da namorada, para guardar consigo o cheiro que sairia pela ruas, longe de suas mãos.

Agora era diferente. O clima frio, a garoa, a solidão que se aproximava. A cada instante estiravam ainda mais a corda do tempo. O ônibus poderia não vir, mas ele veio. O motorista começou a dança dos  braços para encaixar a frente na plataforma correta.

O silêncio precisava ser quebrado, romper a barreira da boca e converter-se em signos compreensíveis para os dois.

Enfim, falam desconexamente.

- Eu volto, espere-me, eu voltarei. Não é para tanto.
- Sim, eu sei, mas dói essa coisa de despedida.
- É temporário, eu volto.
- Então, tá. Vou esperar.
- Então, é isso...
- Sim, é isso....

O ônibus se aproxima ainda mais da plataforma encaixando-se perfeitamente.

O estômago retorce-se em mil e um nó na garganta impede novas palavras.

A moça vigia as malas, enquanto ele mostra o bilhete ao condutor.
Abraçam-se de novo, novas promessa, novos beijos... a impaciência do motorista.
Chega de adeuses, não é o fim do mundo, talvez, o fim de nosso mundo (mas, eles ainda não sabiam disso), que mal começava e já apresentava traços de corrosão no canto dos lábios que arqueavam sobre o queixo.

-Tem certeza? Você volta?
- Sim, eu volto....

Tudo ficou suspenso no ar. O vazio, a solidão de novo a preencher a ausência de um corpo. Ele ainda olha pela janela, procura sorrir, acena tristemente, enquanto o outro corpo vigia, até onde os olhos alcançam, o ônibus que parte só com passagem de ida, sem data certa de retorno.

O tempo que cuidará do resto, começa a corroer os laços, as promessas e até os corpos. Mas, eles ainda não sabem disso



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