No Largo do Arouche
há um índio nu
no meio da rua.
Parado no tempo,
estático de séculos,
contempla as árvores
da praça à sua frente.
À noite, as girls sorumbáticas
de minissaias rotas brancas
ofertam quase nus seus corpos.
Algumas girls têm pênis
e o índio não entende
o lúbrico dos trajes menores,
nem os homens brancos
que trazem papéis coloridos
e brincam com os pajés
travestidos de girls.
Estatual, nacional libidinoso,
pelos séculos amortecido,
o índio acredita ser vingança
dos pajés contra os brancos
que trouxeram doença ruim
e deixaram Iracema de barriga.
O índio chora encarcerado
ao longo de todas as noites.
Tem saudades de Iracema,
tem ódios de Martim.
Transformado em estátua
é pior que Adamastor
ninguém cantou sua vida
não teve a atenção de Camões
para dar brilho à sua dor.
Hipnotizado pela noite
o índio caçador, triste despirocado,
vê as girls de falo em riste
arrombando os brancos
numa grande pajelança
sob as copas da árvores.