terça-feira, 5 de março de 2019

A obscenidade do amor


Quem nunca amou, jogue a primeira pedra! Ou a última! Antes que venha a amar, pois, pode ser que não tenha tempo para atirá-la e seja obrigado a fazer como aqueles que pensavam em apedrejar Jesus, mas de cabeça baixa se afastaram murmurando para si seus pecados.

Amar é uma tarefa árdua, que exige energia e disposição. Amar cansa, só não cansamos de amar e quando pensamos que ele se foi, lá está o amor a nos espreitar em uma foto, uma mensagem de celular, uma lembrança, um perfume ou um gesto que remete à pessoa amada.

Amar é um ato obsceno. Ele nos tirar o pudor, a razão, os padrões antes tão caros ao nosso discurso social, que esvaziado em seus mais íntimos estertores, abjura de nós e nos deixa nus em meio à rua.

O amor é obsceno. Ele nos despe e nos deixa em estado de graça e ao mesmo tempo inseguros de quem somos e se somos o que o objeto amado desejaria. O amor dói em sua ausência, tira-nos a direção, o rumo e não há rotas seguras ou cavernas onde possamos nos esconder, seja no Jalapão seja no Vietnam, o rosto do amor tem nome, pele e gosto insubstituíveis.  

Amar é um ato de despudor. E nunca ficamos tão felizes que, quando despudorados, nos mostramos ao outro sem amarras, sem roupas, sem barreiras, que talvez até um dia havíamos imposto a passageiras paixões que habitaram nossas camas e até, quem sabe, algumas páginas de diários.

A obscenidade do amor está em jogar em nossa cara quem realmente somos. Aquele eu que até nós gostaríamos de pôr para debaixo do tapete é despido pelo amor. E é amor na última essência do que poderíamos imaginar, no mais alto grau de prazer físico e necessidade espiritual, ou como queiram chamar.

O amor é obsceno e sempre estamos despidos diante dele, desarmados, sem chão ou sem horizonte. Amor só se satisfaz com o amor que nos falta. Sem este amor que nos despe, não somos ninguém e por mais que nos vejam pelas ruas e julguem saber quem somos, só aquele que nos ama é capaz de nos conhecer.

O amor é obsceno, mas mais obsceno é viver sem ele, antes estar nu diante de quem nos completa, do que vestidos diante de quem nos deseja. O amor é obsceno, mas não aceita qualquer nudez, porque a obscenidade do amor é reservada apenas para aquele que nos conhece, para quem as palavras já deixaram de ser necessárias, para quem a luz nada mais tem de ensinar sobre o obsceno corpo que amamos.



Um comentário:

Unknown disse...

Wesley, seu talento é obsceno!

  A poesia é essa água que escorre pela boca e d esce pelas bordas  rompendo a barreira dos lábios. Diz e não diz f abula mundos intangív...