A casa ainda dorme no silêncio. Os cômodos estão vazios e alguém ressona no quarto ao lado. As cortinas estão fechadas, guardando o quadro azul para mais tarde. Por ora, me movo a passos leves pela cozinha com medo de acordar a menina. Com ela virão os risos, as brincadeiras, os desenhos. Adio este momento tão certo, essa rotina que se inaugurou há sete anos. Gosto do silêncio também, de olhar para as paredes mudas e para o sofá vazio. Crio a expectativa, sei que ela vai acordar em poucos instantes, mas vivo este momento de solidão. Logo as caixas serão abertas, os potes de massinha espalhados pelo chão, a televisão repetirá o desenho de todos os dias e as cortinas da sala serão escancaradas para a luz do sol brilhar. Gosto destes momentos de cinza e silêncio, me reconstruo à espera dela que abrirá as feridas do tempo, que mostrará minha previsibilidade em dar-lhe o porto que precisa para atracar. Ela ampliou meu vocabulário e inseriu nele a palavra pai, esta palavra tão dolorida, esta nova fase da vida, que vem sem manual de instrução. Ainda me acostumo a esta nova realidade que perdurará, sei, até meus últimos dias. Se fumasse, acenderia um cigarro.
quarta-feira, 14 de junho de 2023
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