Há alguns meses Lyon era uma foto registrada no Google imagens ou no Google maps. Algo ainda não palpável, uma existência de Wikipedia, registros de tripadvisor, assuntos de blogueiros, ou melhor, blogueiras, que não usam blogs, mas Instagram para registrar suas viagens e vender os produtos que carregam pelo corpo.
Lyon era uma espera distante. Um sonho talvez, um objetivo, algo a ser alcançado, talvez um projeto já colocado no futuro remoto das intenções que jamais se cumprem. Postava no Status do Whatsapp fotos de uma Lyon desconhecida, de uma Universidade de Lumière Lyon 2 tão distante quanto uma narrativa de Julio Verne em minha infância. Eu não estava nestas fotos, impossível estar nelas, nem sequer um passaporte eu tinha. Minhas viagens mais longas tinham sido a Buenos Aires e a Asunción. Viagens proveitosas e reveladoras, porém, sempre no Cone Sul, às voltas com os ditadores ou governos populistas estampados nas manchetes de jornais ou, então, nas páginas policiais.
De repente, depois de muito esforço, conversas, boas-vontades de algumas pessoas, que resolveram me ajudar em tempo ou fora de tempo, Lyon começou a crescer, virou uma passagem aérea, uma data, um dia, um embarque, alguns aeroportos no jogo de conexões feito pelas empresas e, quando vi, estava em Lyon. As ruas existiam, as pessoas não eram mais fotos ilustrativas de folhetos de viagens, havia franceses, senegaleses, marroquinos, chineses, gente de toda a parte do mundo circulando sobre e sob as pontes que cortam o Rhone e o Saône. Eu estava em Lyon carregado de malas, uma delas com uma das rodas quebrada, falando um francês enferrujado e tentando entender um novo mundo à minha volta.
Uma vida ficara para trás, interrompida por um ano, suspensa, à espera que eu retorne, diferente, mudado ou a mesma pessoa; talvez com uma bagagem maior de vida, uma experiência a mais. Abria-se uma nova página, que está nos primeiros dias de construção; cheia de receios, incertezas, novidades, choques culturais de um novo Peri em terras francesas, de um Macunaíma em terras próximas dos primeiros pícaros do mundo.
Lyon não era mais apenas uma foto de pesquisas recortadas das páginas de outros viajantes. Percebi que Lyon existe, que o mundo parece pequeno, ou melhor, que o mundo é mundo e no final das contas, as pessoas são pessoas, que viajar é necessário, mas que do outro lado também encontraremos pessoas que precisam viver, que sonham, não com Lyon ou Paris, mas, talvez, com um Brasil cheio de praias, com uma Copacabana de Vinicius e Tom Jobim, com um Pelourinho de Jorge Amado, imaginando-se suadas atrás de um trio elétrico, loucas para fazer partes de uma paisagem desconhecida para elas, que, assim como eu, recortam fotos no Google imagens e colam em seus status de redes sociais.
Hoje, Lyon existe, não é mais um horizonte. Vejo o horizonte daqui e busco um mundo melhor, um local para morar por esse período, mas Lyon está perto demais para ser um horizonte, estou no meio dela em busca de onde me situar, de onde ser um ponto no mapa, de onde existir nesta Lyon tão nova para mim. Por isso, a foto em frente à Universidade Lumière Lyon 2 agora tem um novo elemento na paisagem, temporário por certo; contudo, eterno nos fatos, que um dia serão lembranças, recordações, memórias de fundo de gaveta, que contarei às pessoas e, algumas delas, entre a dúvida e a crença as
verão como anedotas de um velho contador de histórias.